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Cotovias levaram Francisco para o alto

Francisco, peregrino, andarilho, forasteiro. Sempre passando. De lugar em lugar. Delicadas travessias em seu interior. Tentativa matar o velho homem teimoso em não “passar”, não morrer. Poucos anos de vida. Perto de quarenta. Doente, cansado, quase cego. Perto seu fim. Os médicos não davam mais esperança. O Pobrezinho precisava de um chão para deitar e fazer a derradeira páscoa. Decide-se pela capela da Senhora dos Anjos, a Porciúncula.

Quantas recordações daquele lugar. Depois de Rivo-Torto ele e seus primeiros seguidores foram morar em cabanas em torno da tosca capelinha, quantos encontros fraternos, os capítulos, o começo da aventura da irmã Clara. Um pedacinho do céu na planura de Assis. Ali seria o local de concluir a vida, celebrar os anos vividos. Espaço para esperar a chegada Irmã Morte que viria buscá-lo para conduzi-lo à terra dos vivos. Uma irmã.

Arma-se uma liturgia para morrer. O dançarino de Deus, o louco pelo Evangelho, aquele que tinha sido marcado com os sinais do corpo do Crucificado pede que lhe deitem nu na terra nua. Assim acontecera com seu Amado. Nu nascera o menino do presépio e nu morrera o mártir do Calvário. Francisco configurado a Cristo até no momento da passagem. Salmos recitados com júbilo e dor.

Um ser humano que morria. Não um sobre humano. Dando-se conta da proximidade do final pede que Fra Jacoba, sua amiga de Roma, venha dele se despedir. Que não esqueça de trazer aquele doce de amêndoas que ele tanto apreciava. O humano à flor da pele na hora de fechar as cortinas do palco da vida. A amiga chega. Francisco mal e mal deve ter tocado o doce. No meio dos salmos um gesto humano. Um santo que pouco antes de morrer tem vontade de um doce… Humano até o fim.

Francisco tenta olhar para os irmãos. Pede que cantem o Cântico do Irmão Sol. Felix Timmermans assim descreve a cena:

“Seguiu-se um profundo silêncio. Seu braço cedeu e ele se deitou, e um sorriso pálido aflorou em seus lábios cor de púrpura. Seus olhos avermelhados nas órbitas de um azul escuro foram se fechando, vagarosamente e aquele semblante moreno e macilento tornou-se completamente branco. A mão despendeu-se da chaga do coração que apareceu como uma linda e fresca rosa vermelha. Os irmãos permaneceram de joelhos soluçando e rezando… De repente lá fora no telhado, milhares de cotovias como se tivessem combinado, todas ao mesmo tempo, se elevaram triunfalmente para o alto.”

Tardinha inesquecível. No comecinho da noite de 3 de outubro de 1226 era uma lenda que terminava seus dias, um homem como nunca existira antes. Voou para as alturas e continua entre nós. Quem poderá esquecer-se de Francisco de Assis?

 “De repente, lá fora, milhares de cotovias voaram para o alto abrindo o caminho para o luminoso Francisco de Assis.

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

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